Reforma tributária e Simples Nacional: quando vale a pena optar pela não cumulatividade?

A depender do contexto, mudança para a sistemática do IVA Dual pode ser vantajosa para as pequenas empresas, mas exige atenção

Por Leandro Ferreira 

No início do mês de julho, entidades como a Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) e outras organizações representativas do universo do empreendedorismo assinaram um manifesto em favor do Simples Nacional em que são reforçados potenciais impactos negativos da Reforma Tributária sobre o regime que hoje abarca mais de 90% das empresas do país. 

A pauta dos efeitos da Emenda Constitucional 132 no Simples, aliás, já vem sendo debatida há mais tempo: ainda em fevereiro, a Fecomercio de São Paulo apresentou pleitos de micro e pequenas empresas ao Comitê Gestor do regime e lançou notas destacando ressalvas sobre a Reforma. 

As preocupações são pertinentes, haja vista a importância do Simples Nacional para a economia brasileira. 

Responsável pela geração de 70% dos empregos com carteira assinada e por uma parte significativa do PIB brasileiro – números do Sebrae destacam que as micro e pequenas empresas respondem por cerca de 27% do Produto Interno Bruto do país –, o regime, criado em 2006 a partir da Lei Complementar nº 123, foi também um importante vetor para a formalização de negócios e aumento da arrecadação tributária em todo o território nacional.    

Feito este preâmbulo, também é importante ressaltar que, em alguns casos, a mudança para a sistemática da não cumulatividade que sustenta a unificação de impostos proposta na Reforma a partir da criação do Imposto sobre Valor Agregado Dual com suas duas linhas de cobrança (IBS e CBS), pode sim, ser vantajosa em alguns contextos.  

Simples Nacional e Lucro Real: análise de uma hipótese 

Tomemos como exemplo o caso de uma empresa do Simples com alíquota efetiva de 15% que compra e vende para empresas do Lucro Real, cuja carga tributária também é calculada segundo a não cumulatividade. De modo simplificado, em um cenário no qual a empresa efetua a compra de insumos por R$ 800,00 e vende por R$ 1.000,00, sem a incidência de IPI, temos as seguintes possibilidades: 

 

Contexto atual 

Atualmente, a empresa do Simples não possui direito a créditos de PIS, COFINS ou ICMS na compra e sua carga tributária é R$ 150,00 sobre os R$ 1.000,00 da venda. Já o crédito de ICMS gerado para o cliente é o ICMS efetivo (4%), sendo ainda permitida a tomada integral de créditos de PIS e COFINS (9,25%). Nessa hipótese, temos os seguintes indicadores fiscais: 

Carga tributária para a empresa do Simples Nacional R$ 150,00 
Crédito de ICMS gerado para o comprador R$ 40,00 
Crédito de PIS e COFINS gerados para o comprador R$ 92,50 
Total de créditos gerados R$ 132,50 
Custo efetivo para comprador R$ 867,50 

Opção pela manutenção da venda pelo Simples 

No cenário pós implementação da Reforma no qual a empresa do Simples não optou pelo regime não cumulativo, basicamente, não serão gerados créditos para o comprador. Logo, temos o seguinte contexto:  

Carga tributária para o Simples Nacional sobre venda R$ 150,00 
Crédito de IBS e CBS gerados R$ 0,00 
Total de créditos gerados R$ 0,00 
Custo efetivo para comprador R$ 1.000,00 

Opção pela não cumulatividade 

Finalmente, no cenário pós-Reforma em que a empresa do Simples opta por se integrar ao regime não cumulativo do IVA Dual, créditos são gerados para o comprador, ao passo que, no rateio do Simples, o PIS, COFINS e ICMS representam quase metade dos tributos. Assim, ao serem substituídos pelo IBS + CBS, é possível projetar um corte pela metade dos impostos:  

Carga tributária para o Simples Nacional (7,5%) R$ 75,00 
Carga tributária do IBS + CBS a 26,5% R$ 265,00 
Crédito de IBS + CBS na compra R$ 212,00 
Carga tributária total sobre a venda R$ 128,00 
Crédito de IBS + CBS gerados para o comprador R$ 265,00 
Custo efetivo para o comprador R$ 735,00 

Assim, nesse exemplo hipotético, a opção pela não cumulatividade é vantajosa para ambas empresas. No caso do fornecedor do Simples Nacional, há uma redução da carga tributária total sobre a venda, enquanto o custo efetivo para o comprador é consideravelmente menor via aproveitamento de créditos do IBS e CBS.   

Simples Nacional e Lucro Presumido: desvantagens 

Já no cenário de vendas para empresas do Lucro Presumido, tomando o mesmo exemplo como ponto de partida (empresa do Simples com alíquota de 15% que compra a R$ 800,00 e vende por R$ 1.000,00).  

Cenário atual e tratamentos pós-reforma 

De modo objetivo, somente há mudança no cenário atual, em que o custo efetivo para o comprador se mostra maior: 

Carga tributária para Simples Nacional  R$ 150,00 
Crédito de ICMS gerado R$ 40,00 
Crédito de PIS COFINS gerado R$ 0,00 
Custo efetivo para comprador R$ 960,00 

Após a Reforma, o tratamento tributário para as empresas será sempre não cumulativo, assim a simulação apresenta os mesmos resultados do cenário anterior.  

Conclusão 

Como é possível observar, há sim, contextos em que a opção pela não cumulatividade será vantajosa para empresas do Simples – tanto dentro da perspectiva de redução de suas próprias cargas tributárias; quanto pelo viés da diferenciação competitiva, uma vez que o custo efetivo para os compradores pode ser menor em alguns cenários, fato que pode contribuir com a atração de novos clientes. 

No entanto, é importante frisar que tal análise deve ser feita com minúcia e caso a caso, considerando-se, dentre outros pontos, a faixa de tributação do Simples no qual a empresa se enquadra, quais os regimes de seus clientes e se ela vende produtos ou serviços. 

Em outras palavras: as potenciais vantagens trazem também novos desafios e demandam suporte para que os pequenos negócios do país explorem potenciais oportunidades em prol de seu crescimento.

 

Leandro Ferreira é Sócio Especialista em Revisão e Planejamento Tributário no Ferreira & Vuono Advogados. O executivo é Pós-Graduado em Direito Tributário, possui mais de 15 anos de experiência e, ao longo da carreira, tem desenvolvido as melhores soluções para que as empresas evoluam seu planejamento tributário.      

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Publicado no jornal Gazeta da semana

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